25.2.11

A Fazenda



Katerine sentou-se e olhou para o quadro com a pintura da velha fazenda onde morara até tão pouco tempo atrás. Sentiu então o cheiro do verde da grama em que crescera e onde rolara por tantas vezes aos domingos à tarde, depois do almoço com as crianças da fazenda ao lado. Lembrou-se de que, naquela época, achava estar rolando de tédio e inquietação, e deu-se conta de que, na verdade, rolava de prazer por estar ali, livre, vivendo de fazer nada e apenas vendo a vida acontecer. Viu, por trás da árvore no canto do quadro, o desenho dos animais de que tanto reclamara quando queria brincar com suas bonecas, mas a sujeira dos bichos não a permitia ali sentar-se com suas saias brancas e rodadas. Quis a menina nesse momento, sentar-se entre cavalos e pôneis. Só então se lembrou de ter visto pôneis ali. Ocorreu-lhe que sempre adorara pôneis e os tivera em desenhos da escola e na parede do quarto. Chorou Katerine ao lembrar-se, no entanto, de que pouco os tivera curtido, pois quando chegaram seus pôneis à fazenda, Katerine já do lugar se queixava e com a cidade sonhava. Tola Katerine. Katerine tola.

31.12.10

Feliz Ano Outro!!!



Que se mantenham os Amigos. Velhos, antigos, de ontem e sempre. Companheiros e Verdadeiros que são, nas boas e nas más.
Que fiquem as idéias e ideais que nos fizeram felizes e fiéis ao que somos e ao que nos d’a o alimento que faz a alma permitir que o corpo prossiga.
Que os mesmos sejam os prazeres vividos e divididos com quem amamos e admiramos. Com os “Bonecos da prateleira do meio”, sempre indispensáveis e de agradável presença.
Que fique sempre o desejo por descobertas e encontros. Que esse desejo exista para sempre. Velho e bom...desde sempre.
Que não mude o AMOR que sentimos pela Vida e que fingimos ter perdido a cada tropeço bobo que levamos no percurso. Ah, que “os da terceira prateleira” estejam sempre por perto para mostrar o quão pequeno foi o tropeço.
Que surjam sim mais amigos, mais amores, mais amantes, mais desafios e até dissabores, imprevistos, que sejam. Mas que nem tudo seja NOVO, pois na Vida há sempre muito de TUDODIBOM que levamos do que conhecemos, aprendemos, enfrentamos e com o que até nos decepcionamos, mas que nos fazem ENORMES e únicos.
Então, decida você se o viverá como se fosse o primeiro, o único ou o ultimo ano de sua vida. Apenas Viva 2011 com todas as suas forças.
E que ele venha com tudo.
Feliz 2011!!!

30.12.10

Anxiety



Quem está acostumado a ter o controle de toda situação sabe a dor inexplicável que é estar em território desconhecido. A habilidade de fazer mil coisas ao mesmo tempo e ter a certeza de que no final tudo sairá como planejado, pois o processo está em suas mãos, dá ao control freak a sensação de que todo o universo é palpável e que tudo estará sempre na mais perfeita ordem.

Mas, o que fazer quando o passo seguinte não depende só de você? Olhar para o lado e ter que admitir que contar com alguém é, além de admissível, a única alternativa no momento? À frente, apenas a incerteza do que pode acontecer e a dúvida a respeito de como suportar esse tormento.

Há quem sofra com a mesmice. Há quem enlouqueça perante a falta de rotina e CONTROLE.
Como saber distinguir entre conforto e controle? Até aonde vai a necessidade de conhecermos o território em que pisamos? O inimigo que enfrentamos? O amor que encontramos? O sonho que vivemos?

O que dói menos: o “será que devo?” Ou o “eu não deveria ter?”.
Quem inventou a tal da ‘’zona de conforto’’? O ‘’porto seguro’’?
Conforto? Ou Controle?

Há certas habilidades que só são desenvolvidas quando se fazem necessárias, dizem. É a mulher que pari e logo desenvolve o instinto materno para cuidar de seu filho; do mesmo jeito em que o viúvo o faz, por assim ser necessário. A criança que, ao tornar-se adolescente, logo trata de aprender a se virar sem os pais, pois a independência vai dando-lhe ar de responsabilidade e reconhecimento. O novo gerente que logo trata de descobrir razões para reuniões e projetos, a fim de fazer jus à confiança que lhe foi dispensada.

Assim, então, espera-se que também o faça o controlador. Que aprenda a trabalhar com o inesperado, com o elemento surpresa. Que se deixe levar por emoções e, até quem sabe, dissabores frutos de escolhas mal planejadas e intempestivas.

Que se deixe viver. Que pague pra ver.

Será?

21.12.10

O sabor da conquista




Hoje pela manhã vi um flash de uma entrevista com ‘bonitinhos’ da TV a respeito de “Pessoas que tem a pagada boa”. Todo mundo fingiu que o assunto foge completamente ao apelo sexual e falou-se apenas em bom papo, olhares e, no máximo, boa química entre o casal. Okay.
Lá pelas tantas, a pessoa entrevistadora começou a falar na “Pegada Feminina” propriamente dita e quis saber se o tema tem algo a ver com a coragem ou disposição das moças em ‘chegar junto’, ‘dar o primeiro passo’, ‘approach’, ou seja, colocar a fila para andar. Sorrisos à mesa, e algo foi dito a respeito do fato de a mulher ter descoberto que pode sim dar o primeiro passo, o que é algo positivo, segundo ao moçoilos – se é que entendemos direitinho, mas que o que vale ‘é o sabor da conquista’.
Hoje em dia, existe uma corrente que admite que todo o frisson de se ter alguém acaba no exato momento em que você o conquista. Explico: Você, pessoa, por alguma razão, interessante, é vista e desejada por alguém. O outro lado investe e ‘realiza’ que não foi correspondido. Inicia-se aí uma caçada em que o objetivo final é, sim, sim, A Sua Pessoa. “Que delícia”, você pensa. Hmmm, tá. Depois de resistir um pouco, pensa: “Poxa, essa pessoa deve ser legal e só pode estar mesmo a fim de algo bacana”. E cede. Sai com a figura. Doa-se um tiquinho. Descobre que realmente é possível passar um tempo e ver qual é.
“que todo o frisson de se ter alguém acaba no exato momento em que você o conquista”. Lembra? E aí acabou o encanto. O que valeu mesmo foi a arte da conquista, ou melhor, o sabor.
Então, a brincadeira é assim: O rato foge do gato. Que enlouquece por querer muito o roedor. Este, por sua vez, enlouquece pelo fato de ter que viver correndo de seu objeto de desejo...por simples medo de perdê-lo.
Confuso. Real.

16.12.10

O Colecionador




Léo colecionava pessoas. Tinha em seu quarto prateleiras e mais prateleiras repletas de figuras ilustres e ordinárias, todas misturadas, sem muito critério de organização. Femininas e masculinas, como se o propósito fosse realmente apenas o acúmulo, o número, a quantidade.
Um dia, questionado por uma criança que não entedia o porquê de um adulto colecionar ‘brinquedinhos’ assim, Léo falou de seus ‘bonequinhos’. Disse o quanto a coleção era rara e o quanto havia sido prazeroso e, ao mesmo tempo, trabalhoso levantar aquele número.
“Há quem me divirta com sua tolice e ignorância. E a esses nada mais devo do que a última fileira da prateleira lá de baixo. Aquela sem destaque algum. Que ninguém enxerga e na qual ninguém quer mexer.
Os que apenas me seduzem por tamanha beleza ficam ali, veja bem, logo a sua frente. Mas bem no alto, pois lindos e plasticamente perfeitos, logo me cansam com sua obviedade e não mais agüento mira-los diretamente. Os vazios estão nessa mesma prateleira, mas na fileira lá de trás. Nem podemos vê-los, percebe?”
A criança achou que começava a entender aquela idéia absurda e prosseguiu, “Você deve gostar da prateleira do meio.”
“Agradáveis são essas aí. Estão sempre acessíveis e é muito bom que assim seja. Trazem-me conforto e segurança. Lutei e lutaria novamente por elas. Não mexa. Deixe-as aí.”
“E por que aquela está vazia? Também, logo abaixo da janela?”, curioso.
“Ah, criança. Ali é o lugar dos escorregadios. Dos que a mim intrigam a cada momento e por quem luto ao mesmo tempo em que deles fujo. Nessa prateleira está o que me desafia e o que me tenta. O que quero e do que corro. Há dias em que está cheia. Hoje está tudo bem. Está tudo tranqüilo.
Agora vá. Brinque com seus próprios bonecos.”

16.11.10

Cada Macaco na sua Toca



Camaleão saiu do buraco e viu a Arara rondando o formigueiro da D. Aranha que, por sua vez, o olho não tirava da casinha da Cobra de estimação do dono do Rancho, bom Surfista que era. Acolá na frente, corria a Tartaruga, brava e arredia, revoltada com o Chimpanzé que folia não admitia e só dormir queria. A Preguiça suava e sorria, sempre atrás dos filhotes da Gata, que saltavam na grama entre um mergulho e outro na lama que poça virava na porta da coxia. Ursos, Pingüins, Leões e Enguias...tudo era festa naquele galinheiro, uma porcaria. A Girafa gritava e as Cigarras colhiam, cortavam, guardavam, enquanto as Formigas eram vistas aos montes, caídas, entregues ao cansaço de tal anarquia.
E quanto a mim, entregue a minha habitual conformidade das coisas, à apática falta de ansiedade e excitação para coisa alguma, ali a tudo assistia, sem a menor intenção de dar-me, sem o menor desejo ou euforia.

12.11.10

garotos




Que perseguem e levam broncas. Que brincam e brigam e tomam carrinhos e trocam carinhos. Choram, competem, ganham, perdem, esperneiam.
Perseguem e comem escondido. Recusam-se a comer e se escondem. Rabiscam, cortam, colam e grudam e melam e banham e choram.
Perseguem e cabulam. Enganam e se viram. E fingem e conquistam e enganam. Safam-se. Nem choram e nem se escondem.
Perseguem. Esforçam-se. Conquistam. Desistem. Quem chora?

5.11.10

Deixando a Vila




Contornando a Vila hoje à noite, enquanto dirigia para um jantar com amigos, tive uma bela vista dos prédios que hoje abraçam o Bairro em que moro em Sampa. Muitas luzes. Infinitas. Quase tacando o céu, como todas as outras por aqui. O som tocava BB king e o Caménère estava no colo do carona, enquanto os arranha-céus, que tanto de minha estória viveram, observavam o movimento tranqüilo do carro, tímido ao sentir-se observado pelos donos da avenida. Senti desde aquele momento um “quezinho” de nostalgia. Saudade da época em que não me preocupava em pensar se teria tudo isso aqui para sempre. E mais a antecipação do que será sentir falta de tudo que ficará por aqui e que me fará voltar tantas e tantas vezes. Pessoas, lugares, comidinhas....o café pós-balada. Que Capital é aquela que me fará ir pra casa tomar capuccino na chaise? Comer cachorro-quente com molho. Delícia.

22.10.10

Coisa boa



Dá um frio na barriga saber que ao abrir dos olhos a vista será outra. As fronhas terão outro perfume, o ar mais puro convidará à janela e o verde será muito mais exibido que o cinza. O sol baterá mais forte, pois o céu é aberto e muito, mas muito mais azul. Os abraços são antigos mais sentirão como novos. Os sorrisos serão largos por terem experimentado a distância, a saudade e, ao mesmo tempo, o reforçar dos laços. O paladar será mais crítico e diferentemente desafiado. As noites serão mais curtas e, talvez, mais tranqüilas, de início ao menos. Novos olhares, antigos lugares. Doces sabores, ridículos desamores. Ah, como já fomos bestas um dia. Eu já fui. Delícia apresentar-lhe, o que um dia foi o meu tudo e que hoje é um pedaço do que sou. Pedacinho de história. Pedacinho bom. Saudadinha. To indo. Coisa boa.

10.10.10

Puzzled




É que onde há rotina e segurança e amigos também há o vazio. Um vazio que não parece encher-se nem com suor do amor ao que trás satisfação, sucesso e sustento, nem com o prazer de ser desejada e ter o controle dos sentimentos seus ... e do outro. E de outros.

É que onde há a paz de quem te ama e te quer e te abriga e te cuida e te protege há também o vazio de se estar perdido em meio a um mundo a que não se pertence e com o qual em nada se identifica. É sentir-se perdida quando se está nos braços que te querem cuidar.

É que onde há a paz de quem se ama e muito amou e de quem ainda se quer bem há também o vazio da busca por saber se vale a pena a auto-anulação por alguém que nem se quer sabe que carrega tamanha responsabilidade pela infelicidade de seu grande amor.

É que onde há a sua paz e busca pela felicidade e auto-afirmação e conhecimento haverá também a paz daqueles que te amam e respeitam as tuas escolhas.